A Justiça Eleitoral voltou atrás na decisão de cassar os diplomas do prefeito de Iguatu, Carlos Roberto Costa Filho (PSDB), e do vice-prefeito, Antônio Ferreira de Souza (PSDB), anunciada no início de julho por abuso de poder político e econômico nas eleições de 2024. Em nova sentença divulgada nesta segunda-feira (28), a 13ª Zona Eleitoral de Iguatu confirmou os mandatos dos dois.
Roberto Costa Filho e seu vice haviam sido acusados de se beneficiar de um esquema operado pela advogada Márcia Teixeira para obter apoio de um chefe de facção. Além de perder os cargos, os dois foram condenados em primeira instância a oito anos de inelegibilidade e multa de R$ 30 mil. A defesa do prefeito havia pedido a anulação do processo, destacando que não há provas que liguem o nome de Roberto Costa Filho e que o prefeito não chega a ser citado nas conversas da advogada com o chefe de facção.
Os advogados também sustentaram a tese de que a Polícia Civil não poderia ter investigado o caso — ações eleitorais são da alçada da Polícia Federal. A defesa do prefeito também acusou a Delegacia de Iguatu de parcialidade e de adulteração das provas. À época da primeira sentença, o Ministério Público Eleitoral (MPE) já havia opinado que as provas apresentadas no inquérito policial eram insuficientes para comprovar a participação, direta ou indireta, ou mesmo a anuência do prefeito e do vice-prefeito, na negociação entre a advogada e o chefe de facção. Por isso, o órgão se manifestou contra a cassação.
Na nova sentença, o juiz Carlos Eduardo Arrais rejeitou todas as teses da defesa do prefeito sobre parcialidade policial ou falta de competência da Justiça Estadual para julgar o caso, mas afirmou que um novo depoimento da advogada Márcia Teixeira, anexado ao processo ao longo do mês de julho, mudou o andamento do caso. No depoimento, Márcia confirmou ter proximidade pessoal com o prefeito Roberto Costa Filho e admitiu ter trabalhado na campanha dele, mas negou que agisse a pedido deles. "Eu não tinha acesso a eles não, porque eles tinham medo de mim. [...] Eu ia sujar a imagem dele", afirmou Márcia.
As declarações da advogada foram suficientes para o magistrado mudar a decisão anterior.
"Em uma reanálise das premissas do julgado, as declarações da Dra. Márcia Teixeira na entrevista pública lançam uma nova vertente sobre os eventos, descaracterizando a premissa de uma conexão direta, dolosa e ilícita da campanha dos embargantes com a advogada no suposto esquema de abuso de poder econômico e captação ilícita de sufrágio. As provas, que antes pareciam robustas, tornam-se ambíguas e insuficientes para sustentar a condenação, especialmente diante da exigência de prova inequívoca para a aplicação de sanções eleitorais graves", escreveu o juiz.
Segundo o juiz, não há provas suficientes para manter a acusação de que Márcia procurou o chefe de facção para ajudar a campanha de Roberto Costa Filho. "Essa nova perspectiva enfraquece a premissa de ligação entre a campanha e o líder ou membro de facção, que era o cerne da condenação", pontuou Carlos Eduardo Arrais.
"Diante da insuficiência das provas de uma vinculação direta e dolosa dos candidatos com atos ilícitos eleitorais graves, especialmente após as novas informações trazidas pela entrevista da Dra. Márcia Teixeira, a dúvida razoável sobre a configuração plena do abuso de poder econômico e da captação ilícita de sufrágio deve beneficiar os eleitos, garantindo a soberania da escolha popular manifestada nas urnas", conclui o juiz.
O que diz o inquérito
O processo contra o prefeito Roberto Costa Filho começou após a prisão da advogada e influencer Márcia Rúbia Batista Teixeira, em setembro de 2024, já no período eleitoral. Inicialmente, ela foi presa por suspeita de envolvimento com tráfico de drogas, mas durante a investigação, foi descoberto que ela mantinha diálogos com um líder do tráfico de drogas e chefe do Comando Vermelho em Iguatu.
Conforme o inquérito policial, em agosto de 2024, Márcia teria combinado com o traficante Thiago Oliveira Valentim, conhecido como Thiago Fumaça, a transferência de R$ 10 mil para que ele indicasse um "coordenador" para fazer campanha para Roberto Costa Filho no bairro Santo Antônio. A negociação ocorreu quatro dias após a convenção partidária que confirmou a candidatura do prefeito.
O inquérito conduzido pela Delegacia de Iguatu afirma que há várias imagens de câmeras de segurança que demonstram que Roberto e seus coordenadores tinham reuniões frequentes no escritório de Márcia, onde em seguida ela recebia os familiares dos traficantes que iriam conduzir as atividades de campanha. Em sua primeira análise do caso, quando decidiu pela cassação do prefeito, o juiz eleitoral Carlos Eduardo Carvalho Arrais disse que "a ausência de citação do nome dos candidatos promovidos, assim como conversas que foram intencionalmente apagadas pelos interlocutores, ocorreu com intuito de ocultar a conduta e impedir qualquer forma de divulgação que pudesse vir à tona".
"As filmagens não enganam e registram, de forma incontestável, a presença constante do candidato Carlos Roberto Costa Filho ao local [escritório de Márcia], em reuniões com coordenadores, a distribuição indiscriminada de camisas e uma intensa movimentação de campanha. Essa participação direta do candidato, aliada à sua defesa pública e veemente da advogada após a prisão, desmorona a tese de que ele não tinha ciência ou consentimento dos atos ilícitos praticados em seu favor", escreveu o juiz na primeira sentença.
Traficante negociava apoio político
Uma série de depoimentos colhidos pela polícia e a extração dos dados dos celulares dos presos mostra que o traficante Thiago Fumaça era procurado por candidatos que procuravam apoio político nos bairros Santo Antônio e Nova Iguatu. Um deles, o candidato a vereador Jocélio de Araújo Viana, foi preso pela Polícia Federal em outubro por oferecer R$ 50 mil ao traficante pelo seu apoio. Ele foi condenado, em primeira instância, a oito anos de inelegibilidade. O inquérito da Polícia Civil afirma que a advogada Márcia Rúbia agia como uma espécie de coordenadora informal da campanha de Roberto Costa Filho — ela não possuía nenhum cargo oficial dentro da coligação.
Logo após a confirmação da candidatura de Roberto Costa Filho, Márcia teria arquitetado com Thiago a indicação de um coordenador de campanha, que deveria fazer um trabalho de porta em porta para convencer eleitores a votarem no candidato. Então ela transferiu R$ 10 mil para ele por meio do Pix de terceiros. Após a prisão de Márcia, em setembro, partes dos militantes contratados para a campanha de Roberto Costa Filho afirmaram ter parado de receber os pagamentos quinzenais - o que a Polícia Civil considerou um indício de que a advogada atuava como operadora financeira da campanha do prefeito.
"Apesar de agir como coordenadora e 'tesoureira' da campanha, responsável por pagamentos a militantes, seu trabalho não constava na prestação de contas formal. A gravidade da situação é acentuada pelo fato de que a advogada deliberadamente não utilizava contas bancárias em seu nome para as transações financeiras da campanha, alegando ter suas contas bloqueadas por processos", diz o juiz Carlos Eduardo Carvalho Arrais.
Fonte - G1CE. Link.
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